segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

O passado

Achas que devemos revolver no passado?
No passado como?
No passado. Nas coisas importantes que aconteceram, não falam em traumas?
Humm, quer dizer, que entendes por traumas?
Sei lá, não é uma palavra bastante utilizada? Quando há qualquer coisa que te correu mal e te marcou, e não ficou resolvida.
Também não sei o que é isso de ficar resolvido. Se for viver em paz com isso, acho que sim. Mas há coisas que quanto mais falamos sobre elas menos elas se resolvem
Pois, isso acontece-me
Ou seja, realmente é importante sentirmo-nos bem com o nosso passado. Temos muita necessidade de compreender. Enfim, serve-nos para o futuro. Espero que sirva.
Sim, mas há coisas que não compreendes logo quando acontecem, não sentes isso?
Sim, há coisas que parece que só com a distância percebemos.
Nessa altura, achas bom remexer?
Não sei. Se sentimos essa necessidade, acho que sim. Sim.
Mas também acreditas que vem tudo da mãe, e assim?
Não
Então vem de onde? Quais são as razões?
São muitas, normalmente. Acho eu.
Então como faço? Para entender?
Hummm. Porque complicas...?
Eu...?

7 comentários:

Anónimo disse...

"O nosso maior erro consiste em tentarmos colher de cada pessoa em particular as virtudes que elas não têm, e de nos esquecermos de cultivar as que de fato são suas."

(Marguerite Yourcenar)

Anónimo disse...

Inês,
apetece-me dizer que o tempo não existe... Só o New York Times...
Eu vivo no agora-agora com a máxima responsabilidade e no entanto, sinto que o passado é um repositório!
Não aprendo com o passado. Tiro dele encantamentos ou tristezas, mas mais nada...
No futuro, enquanto homem multisensorial, formulo os meus desafios, mas estou longe de os ver cumpridos...
António Freixial

Anónimo disse...

Meus amigos, obrigada pelos vossos comentários...Espero poder contar com eles mais vezes!

Bjs a todos

ZeTomes disse...

speak to me...

para que é que estás a falar em inglês?

porque é o nome duma música que cantaroleio, fala sobre uma pergunta sem resposta... speak to me baby in midle of the night

opá deixa lá o inglês e faz-me entender o que queres dizer com isso

agora vem o piano, 2 notas que soam como duas lágrimas a cair num charco já sem reflexo... olha a noite, ouve a chuva, fala comigo, e lá vêm mais duas lágrimas, fala lá comigo... diz-me...

delira... quem delira prendeu-se ao passado, não sei que te diga nem sei o que queres dizer

não vês que custa, que tenho de arranjar metáforas, pontes, charadas, um nicho no escuro, contorcionismo, uma caixa secreta na areia com conchas da praia que não sabe se deve ser aberta, não percebes que com as tuas perguntas já me escondo que nem um caracol?

e se eu te disser que conheço a música e as perguntas são as minhas metáforas. Importas-te que pare a música, ou ainda necessitas de te sentir protegido como num leito morno numa noite escura sem que te vejam?

Somos duas vozes no escuro, mas ainda preciso da música, dá-me tempo ainda que o tempo não existe quando estou escondido. Confio em ti, desliga-a quando quiseres.

As pessoas quando falam deste passado, citam-no como se fossem momentos que não voltarão a acontecer quer para o bem quer para o mal ou elos duma cadeia que faz o presente?

Podem fazê-lo das duas maneiras simultaneamente ou uma ou outra ou nenhuma, pode nem sequer haver passado. Vou acender um cigarro. Conto-te sobre o meu passado. Tinha uma caixa sabes daquelas secretas, abri-la-o-ia, já nem sei se isto se diz assim, a quem o merecesse. Isto porquê? Porque seria a prova indubitável da minha total exposição e entrega. Já podes parar a música, mete outra.

e essa caixa pertence ao passado? agora sou eu que já não sei fazer perguntas...

O que interessa é que eu saiba que estás aqui comigo, mas continuando, a tal caixa correspondia a todo o meu ser sempre escondido ou apenas mostrado a quem o merecesse, como se a qualquer instante pudesse perder a identidade, compreendes?

ZeTomes disse...

sigo-te. Queres dizer com isso que ao permanecê-la escondida estarias a preservar o teu equilíbrio, e só alguém de mérito poderia conhecer-te realmente e sendo assim só poderia ser tua grande amiga e confidente a tal pessoa. Tinhas-lhe portanto o maior respeito, carinho e por aí adiante. Essa pessoa tinha que ser alguém muito especial para ti, conhecendo-te como tu és, eu diria que serias capaz de morrer por ela, estou a ir bem?

sim. Vamos mudar de música? Sem música ainda me assusto e mordo-me.

Então hipoteticamente se mostrasses a caixa a esse alguém estarias a ligar-te à tal pessoa, e pela forma como tu sentes o passado, eu só poderia conjecturar que os teus sentimentos para com a mesma tornar-se-iam unos e viscerais.

É melhor pores a música do princípio, estou a esconder-me.

Tem calma que não pretendo magoar-te, deposita lá um pouco mais de confiança. Posso continuar?

Deixa-me só ouvir as duas teclas no piano outra vez e depois podes.

Voltando à caixa ainda que abstracta e metafórica, ela já foi aberta na sua plenitude, espera espera, ela já terá sido aberta estando tu convicto ter sido aberta em pleno... melhor, vamos a fundo agora, já a abriste mas sabes que não a abriste totalmente ainda que na altura achasses o contrário... acertei não?

por acaso falhaste mas também lá fizeste tangente, descansa que continuas a ser perspicaz

Vou aceitar a minha perspicácia como a tua caixa...

na altura em que abri a caixa ela na realidade estava em processo de abertura, era talvez um pouco morosa de abrir tão enferrujada estava mais os corais e as algas a dificultarem o assunto, mas estava efectivamente nesse processo.

E a caixa voltou-se a fechar como o caracol que se esconde repentinamente e instintivamente?

Certo, fechou-se e fez-me ferida.

E agora? Que sucedeu à caixa?

Atirei-a para o fundo do mar e já não sei dela, acreditas nesse lugar onde te encontras contigo?

Queres a minha opinião sincera? O passado é como as artes, volta, revolta, aperalta-se, muda de verbo, acrescenta traço, afina voz, mas continua a ser o mesmo da tua da minha do outro de fora independentemente das perspectivas. O passado sofre estas mutações todas mas tal como uma obra tem que ser finalizado, ou então o seu acabamento é mesmo o de ser incompleto.

Então e a reticência, a hesitação, o se, o senão, o que não se pode o que se pode o que se irá fazer o que não se irá fazer, mas deixemos a continuação para o diálogo da culpa.

E se dançassemos uma valsa?

ZeTomes disse...

Ia aceitar a tua proposta mas penso que me estás a fazer uma rasteira, mais um pouco, és capaz, eu sei.

De facto és perspicaz, de facto a única valsa é a da música.

Posso perguntar-te se esta rasteira foi porque sentias que a tua caixa estava a ser exposta?

Sim, já suspiro e lanço-te pragas mas no entanto quero que me ajudes. É difícl lidar com esta bipolaridade de sentimentos. Nem sequer sei se a caixa é um produto da minha imaginação... antecipando-te a pergunta.

Então já somos duas raposas a esconderem as suas caixas de forma a ganharem valor, como os artefactos que se fazem passar por antigos.

Mete lá o funeral da rainha Mary, aquela da banda sonora da laranja mecânica, mas essa são mais estalos do que lágrimas, talvez como aquela fase do choro em que se purga e se fazem barulhos, mete-a lá para me sentir nítido na tristeza do passado e para aguentar as tuas perguntas.

Vou pô-la do principio. os tambores trovejam e as pessoas vão de cabeça baixa, a rainha morreu e sentem-se perdidos... como que peregrinam cortejando o caixão, comiserados por saberem que a dor trouxe-lhes um relevo e uma silhueta dessa sua existência e desse seu ser agora sabedor de existir pela falta.

Armado em poeta, ou armado em caixa?

Armado em perspicácia

Estás a ser tu?

Não divergemos, falamos de ti e não de mim. O teu maior medo é não existir nada de valioso dentro da caixa e de que essa coisa valiosa afinal era fancaria e pelo medo da desilusão sempre adiaste a abertura da caixa, arranjando uma justificação para fechá-la de forma a nunca poder ser vislumbrada, para que ninguém saiba que o que conste lá dentro de nada valha, é essa a ideia que construiste dentro de ti mesmo. É essa a comiseração que se equilibra com a justificação de não ser aberta. Tens medo que essa construção ainda sabendo que produto da tua imaginação possa ser verdadeira.

Só tu para me dizeres isso sem seres esmurrado.

Então estás a dizer-me que abriste a tua caixa perante uma tal pessoa especial, dizes-me indirectamente que essa pessoa estou a ser eu e afinal a caixa não está no fundo do mar e afinal até consegues abri-la, ou estás a representar a peça que gostarias de encenar?

Parece-me que não consigo ter segredos contigo e mais vale ser honesto e cristalino no diálogo... Sim, tenho medo que o que esteja dentro da caixa não seja nada de especial mas também sei que por lapsos já soube tratar-se de algo especial, tendo sido aberta a quem não soube apreciar, tendo sido aberta e fechada a quem merecia ter sido exposta, a quem me trouxe a certeza de era valioso o que lá constava, também sei da pessoa que mais valioso tornou o seu conteúdo ter sido a pessoa mais maltratada, e também sei que por mais que queire abri-la saiba sempre que o que lá está já não vale pela culpa.
A culpa no passado oxidou o lustro do valor no presente. Agora quero ouvir as duas teclas em lágrimas

ZeTomes disse...

Foi a 2ª rasteira e a última, não fomos ao fundo e apesar de não querer vou magoar-te a sério.

Tu queres ser como um imortal, queres ter uma caixa em que o seu conteúdo seja eternamente belo, uma caixa âncora que independentemente de estar aberta estará lá sempre enquanto te fustigas no masoquismo do saudosismo e do conformismo. A esfinge crisálida definha e tens medo que definhe mas não a deixas transformar-se, pensas até quando podes adiar, pensas que já definhou, pensas que é tétrica a quimera da caixa, pensas que não tens caixa que o passado é o único traço restante de ti, que estas letras que continuam nem sequer são tuas que é uma ficção, um diálogo entre duas personagens imaginárias que não tu. E isto vale alguma coisa pensas tu, estas linhas valem-te alguma coisa?

Não é só para ti que as escrevo