domingo, 29 de junho de 2008

Parabéns

Parabéns. Um beijinho.

Vem cá. Dá-me mesmo.

Dou.

Sabes que estou sempre aqui. Ou aí.

Claro. Das únicas certezas que tenho. Ainda ontem olhava a fotografia. Eu devia ter uns dez anos. De vez em quando dou volta às fotografias. Tento identificar as personagens, uma dificuldade.

Pois é natural. Com o passar dos anos. A pele envelhece.

Uma identidade conhecida e desconhecida ao mesmo tempo. Tu. Eu. Nós. O nós também muda de identidade. Uma integração difícil, do nós antigo com o nós actual. No nosso caso é diferente, só eu vou mudando. E tu, aos meus olhos. Esta nossa memória está sempre a mudar. Espalham-se as fotografias pela mesa. E pelos móveis. E pelas paredes. E pelo chão. Ando a abusar dos “e” nestes textos, mas que hei-de fazer, sai-me assim espontaneamente. Tiques de linguagem que também nos caracterizam. Esta sou eu. Sou mesmo eu?

És tu, és. No fotógrafo lá em baixo.

Sempre a mudar, sempre a mudar. E no entanto os mesmos. Das fotografias. Ontem tive necessidade de tirar umas novas. Há mais de um ano que não tirava. Preciso de me renovar. Não me posso arriscar a ficar sem provas. E se me falha a memória? Que ainda por cima não é fotográfica.

Falha sempre. Mesmo nas fotografias. Sorrisos inventados.

Nesta não, estamos todos distraídos. Por acaso com um ar um pouco triste, mas tranquilo. Que se teria passado?

Era o meu dia de anos.

É verdade.

Dá cá um beijinho.

Dou. Parabéns avô.

1 comentário:

Luis disse...

Deve ser bom ainda ter avós quando temos consciência para poder partilhar a sua a experiência de vida.

Quanto às fotografias, não lhes daremos nós demasiado valor? O que acontecia se desaparecessem todas num incêndio? A verdade é que há muitas fotografias na minha família. Mas confesso que as visito pouco. Talvez por me interessar mais o presente (e o futuro?). Ou será medo de ter saudades? Ou medo das perguntas que poderiam surgir sobre o que foi daquelas pessoas, o que será de mim? Medo de confrontar o futuro através do passado?