segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Amor azul

Amor. Dei conta hoje que amanhã é 2ª feira, e que mais uma semana começará.

As semanas não começam, meu amor. Não existem princípios ou fins para as coisas. Tudo isso é uma ilusão.

E esquecemo-nos de comprar pão congelado para o pequeno almoço. Porque és tão inteligente? Não suporto tamanha inteligência. Com isso dos tempos e das ilusões. Poderás apenas averiguar quando é preciso comprar pão para os pequenos almoços da próxima semana?

Lembras-te, amor? Daquelas palavras que dissemos, ainda que encabuladamente, porque as circunstâncias não eram as ideais. Porque insisto em ver-te o que não és? Dizem que os neuróticos só se lembram dos momentos bons, isto quando estão longe. E os outros, dos momentos maus. Sempre prefiro os primeiros.

Estás muito pensativo hoje. E dramático. Que andaste a ler?

Em nome da terra. A Teresa disse-me para descansar a cabeça a ler algo não muito pesado, mas é claro que peguei no que me lembrava ter-me feito derramar lágrimas. Por acaso, agora que penso, não me terá feito propriamente chorar. É de um dramatismo seco, duro. Como esta cara que te ponho, vês? Julgo que não devo fugir. Apenas ter consciência das lágrimas. Que achas?

Acho que de vez em quando devemos mesmo fugir. Desaparecer. Esse canto ainda não está bem. Experimenta outra vez. Põe o pincel azul.

Amor. Pensei em ir para o teatro, para poder ser. Esta nossa vida não me permite. Ser. Como poderei pôr o verde, e o azul, e o amarelo, e as cores todas? Temos tantas cores, e tantas formas, e tanta gente para ser, que não cabem aqui. Não caberão em lado nenhum. Como eu hoje, não caibo em lado nenhum. Só neste cantinho aqui, onde me enrolo enrolo com as cores todas juntas.

Todas dá branco. É uma imagem bonita, tu arrumado ou arrumada num canto a emitir luz branca. De todas as cores de todas as personagens de todas as memórias, de todos os passados.

O passado tem-me passado (esta não era de propósito, mas achei que poderia ficar, e até parecer propositada. E vai mais uma) literalmente à frente nestes dias, como que a pedir que o arrume. Como que a pedir-me que me decida. Mas é muito, são muitas sinapses entre muitos neurónios. São muitas as palavras guardadas, e eu tenho o azar de ter uma boa memória verbal. Deve ser a minha personagem feminina, são as mulheres que se lembram de todas as palavras de todas as pessoas de todos os contextos, mesmo quando proferidas em simultâneo. E às palavras juntas as emoções, os sentimentos, as sensações viscerais, já não sei bem a distinção, e isso permite-te tomar decisões sobre o futuro. De cada vez que surgirem as palavras, ainda que só uma palavra, ou as cores, ainda que só uma cor, as imagens, os contextos, todos os triliões de neurónios que se ligaram antes se voltam a ligar entre si. Tudo para que tu sintas essa cor nessa palavra nesse contexto. Vê bem, são muitos neurónios, todos a disparar ao mesmo tempo, exactamente ao mesmo tempo. Enquanto outros triliões ficam parados, na labuta de arranjarem pão para comer durante a semana. Diz-me tu, não é a memória algo de arrepiar? Tudo isto para quê? E querem que eu mude a cor das palavras, ou dê indicações aos meus biliões e triliões e quatriliões de neurónios, que lhes diga que não quero que disparem, desta vez, em simultâneo?! Que não quero?! Serão outros triliões de neurónios a disparar “não quero!”. Uma luta entre neurónios. Não hei-de eu estar cansado ou cansada, no cansaço não existem questões de género. São muitos anos a juntar-te azul, amor. Levarei os mesmos anos a mudar-te de cor?

8 comentários:

Anónimo disse...

Eu não sei
Se vem de Deus
Do céu ficar azul
Ou virá
Dos olhos teus
Essa cor
Que azuleja o dia...

Se acaso anoitecer
E o céu perder o azul
Entre o mar e o entardecer
Alga marinha, vá na maresia
Buscar ali um cheiro de azul
Essa côr não sai de mim
Bate e finca pé
A sangue de rei...

Até o sol nascer amarelinho
Queimando mansinho
Cedinho, cedinho (cedinho)
Corre e vá dizer
Pro meu benzinho
Um dizer assim
O amor é azulzinho...

Até o sol nascer amarelinho
Queimando mansinho
Cedinho, cedinho cedinho
Corre e vá dizer
Pro meu benzinho
Um dizer assim
O amor é azulzinho...

Anónimo disse...

:)))

Anónimo disse...

http://www.youtube.com/watch?v=UDzygNoOCtE

Anónimo disse...

Olá!
Gosto da tua escrita.
Beijos

Anónimo disse...

Olá Pedro

Obrigada por o dizeres! :)

Beijinhos

Ignez disse...

Olá Inês vim visitar-te :o)
Bjs

Anónimo disse...

Olá Ignez, obrigada pela visita :o)

Bjs

Ruben disse...

Muito bonito!