Há uma árvore ao pé da minha casa
que é um castanheiro. Diz o meu pai, que não é perito em botânica, que se chama
castanhas do diabo ao que de lá cai no chão. O chão da minha rua estava cheio
de castanhas do diabo até há bem pouco tempo, que elas caem lá para Novembro e
a seguir o vento/o tempo
Voa-as
E por que razão não há-de ser
assim? Todas as palavras são verdadeiras no momento em que são ditas, e a
seguir o tempo
Silencia-as.
sem as calar. De modo que para
mim, pode-se dizer que as palavras são a maior invenção de todas, porque
têm este dom de serem sempre verdadeiras mesmo quando mentimos, tendo-me
permitido ser-nos a fingir de verdade. Isto porque o amor não é uma invenção,
senão naturalmente que seria a maior. E a segunda maior invenção é o tempo, que
como é lógico vem depois do início, contra factos há argumentos, mas são
pobres. Ao lado do castanheiro está um pinheiro manso, posso afirmá-lo com
todas as letras, porque aprendi há muito tempo que os pinheiros pequenos,
largos e côncavos eram mansos, é uma associação fácil de fazer, mesmo quando
somos crianças. Enquanto perco horas a ler poemas ou à procura de uma verdade
que me convença a pele ou por fim a encontrar as palavras que lhe traduzam os
silêncios, o que talvez vá dar tudo ao mesmo, passo muitas vezes os olhos pelas
árvores, que se vêem daqui da janela. É preciso tempo para acreditarmos
- come devagar, que te engasgas
e olhar para as árvores dá-me/dá-lhe
frutos, que queres que te diga? Porque o tempo das árvores é mais longo do que
o nosso, que é curto. Na outra árvore ao lado do pinheiro, que eu não sei como
se chama (nem o meu pai), há papagaios verdes com uma cauda longa. São mesmo
papagaios, não tenho dúvidas, porque nos/os fui procurar ao dicionário
dos símbolos,
“É [o papagaio] uma
personificação específica de conteúdos que são repetidos sem questionamento e
sem que se pare para fazer avaliação. Costuma levar ainda a projecção de ser um
símbolo do inconsciente”
palavras com certeza sábias, e
porventura certas, porque terão sido escritas por um(a) perito(a) em simbologia
e em papagaios. Há uma árvore, ao pé da minha casa, que dá uns frutos que têm
uma casca dura e castanha, parecidos com as castanhas mas maiores. Diz o meu
pai, que apesar de não ser perito em botânica é bastante convincente, que são
castanhas do diabo. Mas espera, que o vento voa-as e então eu desço as escadas
e pergunto ao tempo que passa notícias do meu
coração que não sente os olhos que não vêem a pele que não toca a
boca que não fala a boca que não cala
e o vento nada me diz. Não encontrei
castanha nenhuma, nem daquelas que se escondem nos silêncios. Vi de repente
isto tudo, com estes olhos que a terra há-de comer. Zero. Sendo que o zero é a
terceira maior invenção do mundo, porque é uma linha fechada cheia de
- come devagar, que te enganas.
Que queres realmente dizer?
Nada.