Tantas horas nos separam, que achei por bem dar-te o mar. Era de tarde e eu estava já cheia de Janeiro e de rabanadas e de arroz doce. Pensei então
- levo o cão, o Max
Eu não tenho nenhum cão, mas sempre que vou até à praia no inverno imagino que sim, e que ele anda comigo sem trela mas nunca foge. Julgo que nunca te disse
Dizes agora
mas quando te escrevo fico antes muito tempo a olhar fixamente para as horas entre nós
Max! Apanha!
e o coração bate por vezes tão forte, que num impulso agarro no cão e nas tralhas, meto-os na pesada mala azul que anda sempre comigo
Que pesada, dás cabo das costas! O que é que levas aí, o teu cão?!
desço até à praia (ou subo? Fica a decisão por tua conta, enquanto o tempo ainda nos separa), e embalo-me com o movimento do mar a matar as horas. Sabes porque é que o mar parece azul? Porque essa é a única luz que não é absorvida, e tudo o que não é por nós absorvido reflecte-se no exterior. O Max aparece sempre que me encontro nestes estados emocionais, pressentindo que preciso de o ver correr na praia. Porque os cães são animais extremamente intuitivos, mais ainda quando são imaginários. Julgo que nunca te disse
Dizes agora
mas de cada vez que olho para o mar a matar o tempo, ou mesmo para o Max a correr na areia, sei que és tu que, num passo de mágica, me devolves essa imagem. O meu olhar é tão concentrado que juro que consigo ver-te do outro lado
Do espelho?
mesmo existindo o mundo cheio de horas entre nós. Nesse instante (poderá ser às zero horas do dia de amanhã?), apesar de tu estares a fixar uma qualquer outra imagem, como a do senhor da tabacaria ou a da mesa com tampo de vidro em frente ao teu sofá, os nossos olhares cruzam-se e damo-nos o mundo de presente
Aqui Max, estou aqui!
Talvez se resuma a isso a vida, a esta troca instantânea de olhares com o mar como objecto intermediário. Corro a telefonar-te e a agradecer-te, na esperança de encontrar-te ainda do outro lado do espelho
- Obrigada colibri! que lindo azul!
- o meu mar é branco - respondes
E eu sorrio, ao constatar que as horas começaram de novo a crescer entre nós. Então, já cheia do azul do mar que me deste e ainda com pouco tempo de distância de ti (passaram-se entretanto apenas alguns minutos), agarro nas tralhas e no cão
Max, onde estás? Max!
Eu não tenho nenhum cão mas sempre que vou até à praia no inverno imagino que sim, e que ele anda comigo sem trela mas nunca foge. Julgo que nunca te disse
Dizes agora
mas os cães são animais extremamente intuitivos, mais ainda quando são imaginários. O Max desaparece sempre que me encontro nestes estados emocionais, pressentindo que o movimento das suas patas na areia me desconcentrará do azul e do tempo que aumenta entre nós antes de te escrever. Subo até casa (ou desço? Tens agora todo o tempo do mundo para decidir), e olho fixamente para as horas instantes antes, mesmo mesmo antes de te escrever e de te dar o branco do mar.
- levo o cão, o Max
Eu não tenho nenhum cão, mas sempre que vou até à praia no inverno imagino que sim, e que ele anda comigo sem trela mas nunca foge. Julgo que nunca te disse
Dizes agora
mas quando te escrevo fico antes muito tempo a olhar fixamente para as horas entre nós
Max! Apanha!
e o coração bate por vezes tão forte, que num impulso agarro no cão e nas tralhas, meto-os na pesada mala azul que anda sempre comigo
Que pesada, dás cabo das costas! O que é que levas aí, o teu cão?!
desço até à praia (ou subo? Fica a decisão por tua conta, enquanto o tempo ainda nos separa), e embalo-me com o movimento do mar a matar as horas. Sabes porque é que o mar parece azul? Porque essa é a única luz que não é absorvida, e tudo o que não é por nós absorvido reflecte-se no exterior. O Max aparece sempre que me encontro nestes estados emocionais, pressentindo que preciso de o ver correr na praia. Porque os cães são animais extremamente intuitivos, mais ainda quando são imaginários. Julgo que nunca te disse
Dizes agora
mas de cada vez que olho para o mar a matar o tempo, ou mesmo para o Max a correr na areia, sei que és tu que, num passo de mágica, me devolves essa imagem. O meu olhar é tão concentrado que juro que consigo ver-te do outro lado
Do espelho?
mesmo existindo o mundo cheio de horas entre nós. Nesse instante (poderá ser às zero horas do dia de amanhã?), apesar de tu estares a fixar uma qualquer outra imagem, como a do senhor da tabacaria ou a da mesa com tampo de vidro em frente ao teu sofá, os nossos olhares cruzam-se e damo-nos o mundo de presente
Aqui Max, estou aqui!
Talvez se resuma a isso a vida, a esta troca instantânea de olhares com o mar como objecto intermediário. Corro a telefonar-te e a agradecer-te, na esperança de encontrar-te ainda do outro lado do espelho
- Obrigada colibri! que lindo azul!
- o meu mar é branco - respondes
E eu sorrio, ao constatar que as horas começaram de novo a crescer entre nós. Então, já cheia do azul do mar que me deste e ainda com pouco tempo de distância de ti (passaram-se entretanto apenas alguns minutos), agarro nas tralhas e no cão
Max, onde estás? Max!
Eu não tenho nenhum cão mas sempre que vou até à praia no inverno imagino que sim, e que ele anda comigo sem trela mas nunca foge. Julgo que nunca te disse
Dizes agora
mas os cães são animais extremamente intuitivos, mais ainda quando são imaginários. O Max desaparece sempre que me encontro nestes estados emocionais, pressentindo que o movimento das suas patas na areia me desconcentrará do azul e do tempo que aumenta entre nós antes de te escrever. Subo até casa (ou desço? Tens agora todo o tempo do mundo para decidir), e olho fixamente para as horas instantes antes, mesmo mesmo antes de te escrever e de te dar o branco do mar.